João Garcia

Batalha do Brigue Amstrong – Um lugar esquecido

26 de Setembro de 2024


Passam hoje 210 anos da batalha entre o brigue americano General Armstrong e navios da Armada Inglesa, na Baía da Horta. Este acontecimento histórico internacional, que culminou com o afundamento do navio americano, foi determinante para o remate da independência norte-americana.

A batalha desenrolou-se na noite de 26 para 27 de setembro de 1814, na baía da Horta, e foi um dos acontecimentos mais emocionantes que a Horta testemunhou. Vivia-se, então, a Guerra de 1812-1815, entre os EUA, a Inglaterra e a Irlanda e suas colónias, um período de grandes batalhas terrestres e navais entre aquelas potências. O brig “General Armstrong” foi uma das fragatas de guerra mandadas construir após a declaração da independência dos Estados Unidos, em 1783, para fazer face aos ataques dos piratas argelinos e tunisinos no Mediterrâneo e Atlântico Oriental e estava equipado com um emblemático canhão recuperado no início das hostilidades com a Inglaterra em 1812 - o “Long Tom” - nome afetuoso com que a peça fora batizada.

Em 1813 a Inglaterra impôs um bloqueio naval à costa leste dos Estados Unidos, e um ano depois, suspendeu praticamente todo e qualquer movimento mercantil naval nessa zona. Para além da Marinha de Guerra convencional, o Congresso Americano viu-se na contingência de emitir cartas de corso, de modo a poder aumentar a sua influência nos mares. Munido de uma destas cartas, o Capitão Samuel C. Reid partiu de Nova Iorque, a 9 de setembro de 1814, em direção aos Açores, a bordo do brigue “General Armstrong”. A tripulação de 90 homens ancorou pela primeira vez no Porto da Horta a 26 de setembro, pelo meio-dia, no intuito de proceder à aguada. Pouco antes do pôr do-sol, dobraram a ponta nordeste do porto da Horta três navios ingleses: o brigue “Carnation”, comandado pelo Cap. Bentham, o navio de 38 canhões “Rota”, capitaneado pelo Capitão Somerville e o navio de 74 canhões, “Plantagenet”, comandado pelo Capitão Robert Lloyd. O Cap. Reid viu-se obrigado a fugir até junto do forte de Santa Cruz para proteger o navio. A operação de lançamento e escoramento da âncora fez com que este se movimentasse na direção da tensão. Às 20 horas, o Cap. Reid ordenou que fosse lançado fogo sobre os escaleres, matando e ferindo no processo vários marinheiros ingleses. Despeitado, Cap. Lloyd ordenou o envio de mais 12 escaleres de assalto, dotados de infantaria. Perante os olhares curiosos das gentes do Faial debruçadas nos muros da cidade, partiram ao encontro do navio corsário várias embarcações de pequeno porte.

No ataque que se seguiu e que durou cerca de cinquenta minutos, apenas quatro das doze lanchas inglesas saíram indemnes da refrega, afundando-se mesmo três delas. Dos quatrocentos homens que as guarneciam, metade foram feridos ou mortos. Em resposta a mais esse desaire, o comandante inglês perdeu as estribeiras e ordenou ao brigue “Carnation” que bombardeasse o corsário americano. A fúria de destruição foi tanta que nem as casas, nem a população faialense, escaparam à barragem de artilharia que venceu a tripulação do “General Armstrong”.

A demora do Cap. Lloyd no Faial foi de ruinosas consequências para a Inglaterra. O programado era reunir-se à esquadra que estava a congregar-se na Jamaica com o objetivo de atacar New Orleans. Mas os reforços chegaram tarde, em particular o Cap. Lloyd, que tivera um atraso de dez dias, dando a possibilidade da armada americana posicionar-se para defesa. O ataque inglês a New Orleans foi um desastre e constitui o mais belo remate que podia ter a guerra da Independência.

Esta história teve no nosso país uma conclusão algo embaraçosa ao nível diplomático. Após o afundamento, o Cap. Reid protestou ao cônsul americano no Faial, John B. Dabney, e ao governo português, pela afronta que sofrera ao ver destruído o seu navio num porto supostamente neutro e a estupefação que sentira pela incapacidade que os portugueses tinham demonstrado em fazer valer essa mesma neutralidade. Do mesmo modo, reclamou uma justa compensação pelos danos sofridos. Napoleão III, decidiu em favor dos ingleses pelo que a disputa se prolongou até 1884, altura em que viria o filho de Reid a gozar de uma indemnização.

Enviado para o fundo da baía da Horta, o canhão “Long Tom” viria mais tarde a ser recuperado pelos portugueses que o integraram no parque de artilharia existente no forte de Santa Cruz. Aí foi encontrado pelo filho do capitão Reid, que se deslocou aos Açores em 1890. Entretanto, a figura de proa do corsário fora transportada para Bagatelle, uma das residências do cônsul Dabney no Faial, e era enfeitada com hortênsias todos os 4 de Julho, até que, em 1867, foi doada pela família Dabney, ao Navy Yard Museum de Charleston.

Este acontecimento histórico, entre as potências americanas e inglesas, é encarado como essencial para enfatizar a localização estratégica do arquipélago e em particular da ilha do Faial.

Esta batalha histórica está intimamente ligada ao Forte de Santa Cruz, não só porque a batalha decorreu nas suas imediações, e porque deu refúgio à tripulação americana após o afundamento do brigue Gen. Armstrong mas, também, porque albergou durante várias décadas uma das peças de artilharia daquele brigue, o célebre canhão Long Tom (atualmente exposto no Museu de Washington). No entanto, a área frontal do Forte de Santa Cruz, voltada para o mar (Marina da Horta), encontra-se esquecida, em absoluto abandono, num estado de descuido lamentável, o que é uma pena para um local com tal relevância histórica, que merece outro tipo de valorização.

Em muitas cidades onde se passaram acontecimentos de igual magnitude e relevância, já foram criados marcos comemorativos, semelhantes àqueles locais que visitamos em várias partes do mundo e dos quais guardamos uma fotografia como recordação. Infelizmente, continuamos teimosamente a falhar na valorização da nossa história, do nosso património e da nossa cultura, subestimando a sua importância para o futuro das gerações.

Passam hoje 210 anos da batalha entre o brigue americano General Armstrong e navios da Armada Inglesa, na Baía da Horta. Este acontecimento histórico internacional, que culminou com o afundamento do navio americano, foi determinante para o remate da independência norte-americana.

A batalha desenrolou-se na noite de 26 para 27 de setembro de 1814, na baía da Ho…





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