A chegar o fim do ano, o momento é propício a reflexões.
Numa época em que a comunicação social passa por grandes constrangimentos, decidi hoje abordar o assunto. Subjacente ao problema está a questão da censura, de que os seus defensores não falam, porém existe.
Entre censura, tratamentos de favor e a tentativa de abater a comunicação social privada, sobressai a questão de fundo: há ainda quem, ocupando cargos públicos, continua a gostar dos métodos salazaristas do Estado Novo.
Sem mais delongas passo aos exemplos, aqui bem perto de nós.
Há uns meses, compareci no salão nobre da Câmara onde decorria uma sessão da Assembleia Municipal. No lugar do público, nas condições de cidadão e de jornalista, que acumulo, pedi a palavra, que me foi concedida. Utilizei os cinco minutos que me eram destinados, fazendo duas perguntas ao presidente da Câmara, cujas respostas não foram por mim consideradas satisfatórias. E ainda ouvi uma reprimenda da presidente da Assembleia, advertindo-me que ali só podia falar como cidadão e não como jornalista.
Depois do presidente me responder usou da palavra, sobre o mesmo assunto, o deputado municipal do Partido Socialista, Rui Santos. O presidente da Câmara também lhe respondeu.
Após esta resposta o referido deputado não voltou a usar da palavra. Pedi então à presidente da Assembleia se me concedia a palavra pela segunda vez, visto que o presidente da Câmara também tinha falado duas vezes sobre o mesmo assunto, o que me foi recusado.
Entretanto o deputado municipal Rui Santos informou a presidente que, beneficiando o seu grupo ainda de tempo, estava disponível para mo ceder. A presidente, zelosa do cumprimento da lei, recusou, informando que a cedência de tempos só é permitida entre os grupos municipais, o que aliás está expresso no Regimento.
Na semana passada, na mais recente sessão da Assembleia Municipal, estando no uso da palavra, o presidente da Câmara esgotou o respetivo tempo e solicitou ao representante do PPM que lhe cedesse o seu tempo, pedido que foi aceite por Teresa Ribeiro.
Para o meu caso, valeu o cumprimento do Regimento; para Carlos Ferreira, não.
Bem sei que as minhas intervenções não agradam a Teresa Ribeiro, ao contrário das intervenções de Carlos Ferreira. Por razões óbvias. Tratou-se objetivamente de tratamento de favor ao presidente da Câmara que, já agora, não devia ter sido permitido pela oposição, pois os disciplinados deputados municipais da maioria, por conveniência e por medo, não ousam questionar as decisões da presidente.
Teresa Ribeiro decidiu arbitrariamente, por interesse e desprovida da imparcialidade que se lhe exige. Não foi com certeza por desconhecer o Regimento, que Carlos Ferreira não conhece, ou não teria feito a manobra. O que não é de estranhar uma vez que acontece o mesmo com o Regimento das reuniões da Câmara, que ele próprio também votou.
Para dar fundamento à afirmação anterior, vou relatar mais um facto, que já tornei público.
As reuniões da Câmara, segundo o Regimento, são todas públicas. Foi uma escolha deste executivo.
Estava assistindo a uma reunião da Câmara com o meu colega jornalista, quietinho e caladinho no meu lugar, quando sou surpreendido pela ordem do presidente para sairmos da sala. Como a reunião era pública, comuniquei que não tencionávamos acatar a ordem. Depois de uma pequena discussão e de uma ameaça de chamar a Polícia, Carlos Ferreira estava atrapalhado porque não sabia como resolver o problema. Por delicadeza, saímos.
Outro caso está relacionado com uma reunião da Comissão de Toponímia.
A Câmara decidiu sobre o nome a atribuir a duas ruas, em função do parecer da Comissão. Pedi ao presidente da Câmara acesso à ata da reunião da Comissão da qual resultou o parecer entregue à Câmara.
Fui informado que a tal ata não podia ser tornada pública por se tratar de uma comissão de natureza consultiva. É tão ridículo que nem sequer é preciso recordar que na Câmara não se conhece a lei. Vim a saber depois que a ata simplesmente não existia.
Finalmente o último exemplo. O presidente da Câmara convocou uma reunião extraordinária do executivo para apreciação e votação das propostas de Plano e Orçamento para 2025. Teve o cuidado de me informar que eu não poderia assistir porque se tratava de uma reunião extraordinária.
Evidentemente que me apresentei, acompanhado do meu colega, na sala das sessões no dia e à hora da reunião, pois queríamos fazer o nosso trabalho de jornalistas, a que, não é preciso recordá-lo, temos direito. Ninguém nos impediu. Alguém deve ter lido o Regimento durante a noite.
Perante os factos relatados já não me restam dúvidas que o poder está a ser interpretado e exercido, no concelho da Horta, por quem nunca compreendeu a liberdade de expressão, os direitos dos outros, a democracia.
Fica para o próximo texto a reflexão sobre o poder regional, também ele, agora, empenhado em ressuscitar a censura, tenha ela a forma que for mais conveniente.