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Trapalhada sem fim

por Incentivo
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Ano após ano, repete-se o mesmo cenário no transporte aéreo que nos liga ao resto do país e entre as ilhas. Cancelamentos sem justificação plausível, atrasos constantes, bagagens perdidas e, acima de tudo, um gritante desprezo pelas necessidades reais das pessoas — especialmente as que viajam por motivos de saúde ou por obrigações inadiáveis.

O Faial, em particular, vive sufocado. É cada vez mais difícil conseguir lugar nos voos inter-ilhas ou nas ligações com Lisboa. Já uma ligação ao Porto implica paragens longas em São Miguel e na Terceira. Tudo lotado, tudo saturado, tudo mal gerido. Já ninguém se espanta com a falta de planeamento — o que surpreende, sim, é a apatia faialense com que se assiste a este colapso anunciado, em contraste com um passado bem recente.

As queixas acumulam-se, mas continuam a cair em saco roto. Os responsáveis, ano após ano, prometem soluções que nunca chegam. E, enquanto isso, os preços disparam. Para uma família faialense não residente, vir de férias tornou-se um luxo. Um destino que devia acolher os seus com orgulho transforma-se num pesadelo logístico e financeiro.

A pergunta impõe-se, mais uma vez, com a força do desespero: até quando vamos continuar a tolerar esta trapalhada monumental, que tantos garantiram resolver, mas que permanece — ou até piora?

Chega de promessas ocas. Exige-se ação, responsabilidade e respeito pelos faialenses e por todos os que têm esta ilha no coração.

 

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Em vésperas de eleições, lá chegam os grandes anúncios, antes tão criticados, hoje uma normalidade. A poucos meses das Autárquicas é quase todos os dias: o estudo prévio para a requalificação da Vista Alegre e o estudo prévio para a proteção de Porto Pim são apenas dois exemplos — nada previsto para se concretizar este ano. O furacão Lorenzo foi há seis anos e continuamos à espera de soluções concretas.

Até quando vamos assistir a esta política do anuncia e adia? Onde estão os prazos, os compromissos reais? A Vista Alegre continua encerrada e Porto Pim vulnerável.

Apesar de tudo, é justo reconhecer que, no caso da Vista Alegre, a Câmara Municipal da Horta apresentou publicamente o projeto e teve o mérito de envolver a população no processo. Foi um sinal positivo de abertura e diálogo com a comunidade. Ainda assim, não posso deixar de manifestar a minha total discordância quanto à substituição da calçada tradicional — um elemento identitário da nossa terra, que vai sendo sacrificado em nome de uma modernização pouco sensível ao património. Em várias regiões do país está a fazer-se precisamente o contrário: valoriza-se e preserva-se aquilo que nos distingue. Já no caso de Porto Pim, o processo ficou claramente aquém do esperado. Sendo uma área de elevada sensibilidade patrimonial, tanto ao nível edificado como natural, era essencial garantir o envolvimento da comunidade desde o início. Aqui, o Governo Regional, como tem sido habitual no caso do Faial, não liderou nem convocou o debate público — teve apenas o mérito de, ainda que involuntariamente, ver a sociedade civil mobilizar-se em defesa daquele património, como bem demonstrou a criação da petição para a salvaguarda da baía do Porto Pim. Perdeu-se uma oportunidade valiosa de construir uma solução partilhada para um dos espaços mais emblemáticos dos Açores.

 

Cooperativa Agrícola de Lacticínios do Faial (CALF)

A situação não pode continuar a ser varrida para debaixo do tapete só porque é incómoda. É verdade que o tema é delicado, mas não é apenas um problema dos cooperantes. A responsabilidade política e empresarial não pode sobrepor-se ao dever de enfrentar a realidade e de esclarecer os faialenses.

O setor leiteiro no Faial atravessa um momento crítico. Ignorar o futuro da CALF é ignorar o sustento de dezenas de famílias, o emprego direto e indireto que a cooperativa gera e o impacto económico e social no tecido empresarial da ilha.

Precisamos de uma estratégia clara, transparente e séria para perceber o que está realmente em jogo. O que vai acontecer aos produtores? Aos trabalhadores? À economia local?

Este não é o momento para silêncios, como sucedeu com o encerramento da COFACO. É tempo de colocar o Faial acima de interesses políticos e encarar o futuro do setor leiteiro com coragem, responsabilidade e verdade.

 

Cidadania

Está em curso uma petição promovida pelos pais e encarregados de educação da Escola António José d’Ávila — um bom exemplo de cidadania ativa e de sentido prático. O pedido para antecipar a abertura da escola para as 07h45, para responder a uma necessidade real de muitas famílias que enfrentam dificuldades em conciliar os horários de trabalho com o funcionamento escolar.

Este apelo coloca no centro da discussão política aquilo que mais importa: o bem-estar das crianças e o equilíbrio da vida familiar. Garantir um acolhimento seguro e supervisionado antes do início das aulas é um passo simples, mas com grande impacto na rotina diária de pais e alunos. É de sublinhar o tom responsável da petição, que reconhece os desafios logísticos, mas apresenta a proposta com espírito construtivo e colaborativo.

Algumas críticas surgidas nas redes sociais sugerem que os pais procuram “desresponsabilizar-se”. Mas essa visão ignora a realidade de quem não tem rede de apoio familiar ou resposta no setor privado. Essas famílias ficam sem alternativas. Temos muito por fazer neste domínio e muito a aprender com os modelos de apoio familiar implementados noutros países europeus. O julgamento apressado é demagogia própria dos tempos em que vivemos.

A Assembleia Legislativa tem agora a oportunidade de agir com sensibilidade social e compromisso com uma sociedade mais justa. Apoiar esta petição é apoiar as crianças, as famílias e o futuro da nossa comunidade.

 

18 milhões para o Porto

No mais recente anúncio da Presidente do Conselho de Administração da Portos dos Açores, Sancha Costa Santos, ficámos a saber que está em preparação um plano de desenvolvimento para o Porto de Ponta Delgada, com foco na modernização e redimensionamento daquela infraestrutura. Um investimento projetado na casa dos 18 milhões de euros, que se soma a uma linha de continuidade já evidente: o reforço quase exclusivo num só Porto, enquanto o Porto da Horta fica para segundo plano — ou pior, votados ao esquecimento.

É impossível não notar a ausência gritante do Porto da Horta nestas estratégias de desenvolvimento. Outrora bandeira eleitoral do PSD-Faial, o porto da cidade da Horta foi repetidamente mencionado em campanhas como pilar do progresso económico da ilha. E no entanto, passados anos de promessas e sucessivos anúncios públicos, o Porto da Horta continua sem um plano estruturado, sem datas, sem investimentos significativos, sem sequer uma menção nas mais recentes prioridades de investimento.

Como se justifica este silêncio da Portos dos Açores sobre a Horta? Onde está a visão integrada e regional prometida tantas vezes pelos decisores políticos? Enquanto Ponta Delgada recebe estudos, planos e milhões, a Horta vê a sua infraestrutura degradar-se, com limitações operacionais visíveis e impactos diretos na atividade económica e turística da ilha do Faial.

É particularmente preocupante que, num arquipélago cuja coesão regional é constantemente invocada, os investimentos continuem a ser canalizados de forma desequilibrada. A Horta não pode continuar a ser apenas um ponto no mapa das promessas eleitorais, ressuscitado de quatro em quatro anos para depois ser novamente empurrado para a gaveta das prioridades esquecidas.

É tempo de exigir responsabilidade. É tempo de cobrar os compromissos feitos à população do Faial. E é tempo, sobretudo, de incluir o Porto da Horta num plano de desenvolvimento digno, proporcional e transparente — com prazos, com orçamento e com vontade política real.

A exclusão sistemática da Horta dos planos estruturais da Portos dos Açores não é apenas um erro estratégico; é uma injustiça.

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